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Informação em prospecto da Petrobras pode gerar questionamento de investidores

A Petrobras se posicionou no sentido de que a Lei do Petróleo se sobrepõe à Lei das SA, de forma que o governo não deve perder o controle da empresa após três anos seguidos sem pagar dividendos. Contudo, um detalhe no prospecto da oferta de 2010, usada para capitalizar a empresa, pode levar a petroleira a responder por eventuais perdas dos acionistas, segundo advogados.

O prospecto diz o seguinte: “Nos termos da Lei das Sociedades por Ações, os titulares das nossas ações preferenciais, incluindo sob a forma de ADSs, não têm direito de voto nas deliberações das nossas assembleias gerais de acionistas, exceto em circunstâncias especiais, incluindo na eventualidade de deixarmos de pagar a esses acionistas o dividendo mínimo prioritário a que fazem jus, de acordo com nosso estatuto social, por três exercícios consecutivos”.

Os advogados do escritório Machado Associados, Renata Pisaneschi e Mauro Mori, dizem que há quem defenda que, mesmo no caso de uma empresa estatal como a Petrobras, as ações preferenciais sem direito de voto devem adquirir esse direito. No entanto, explicam, há também uma corrente que entende que essa regra não se aplica a empresas sujeitas a leis especiais, por causa do interesse público em torno da atividade desenvolvida pela companhia em questão.

“Esse entendimento seria inclusive corroborado pelo art. 235 da Lei 6.404, que dispõe que a sociedade de economia mista deve observar a lei federal que instituiu sua criação”, explicaram os advogados. Conforme esse artigo, as sociedades anônimas de economia mista estão sujeitas a essa lei, sem prejuízo das disposições especiais de lei federal.

“Assim, pode-se argumentar que a lei especial prevaleceria (no caso, a Lei do Petróleo) sobre a lei geral (Lei das S.A.), sendo essa uma regra geral de interpretação do ordenamento jurídico”, explicaram Renata Pisaneschi e Mauro Mori.

O artigo 62 da Lei do Petróleo (9.478/97) cita que a União vai manter o controle acionário da Petrobras com a propriedade e posse de no mínimo 50% das ações, mais uma ação, do capital votante. Além disso, diz que as ações preferenciais não terão direito a voto.

“O capital social da Petrobras é dividido em ações ordinárias, com direito de voto, e ações preferenciais, estas sempre sem direito de voto”, diz o parágrafo único do artigo 62.

No entanto, ainda que não ocorra mudança no controle acionário da Petrobras, a empresa pode ter de enfrentar questionamentos de investidores, em função da informação que consta do prospecto.

A esse respeito, os advogados do Machado Associados citaram que o prospecto não deverá conter informações que possam induzir os investidores em erro, conforme o artigo 38 da Instrução CVM nº 400/2003. Além disso, deverá conter informações sobre “os valores mobiliários objeto da oferta e os direitos que lhe são inerentes”, sendo considerada infração grave a distribuição com informações “falsas ou tendenciosas” no prospecto.

Alberto Bragança, sócio da área de Private Equity e Mercado de Capitais do Veirano Advogados, diz que esta é uma questão complexa e há margem para discussão, mas, à primeira vista, os titulares de ações PN eventualmente podem ter um pleito de perdas. “Creio que isso possa implicar responsabilidade dos administradores. Contudo, teria de provar que houve prejuízo derivado dessa circunstância”, opina.

Procurada, a Petrobras respondeu que “está sob a égide da Lei do Petróleo, a qual estabelece, em seu artigo 62, que as ações preferenciais da companhia serão sempre sem direito de voto, além de impor propriedade e posse de no mínimo 50% mais uma ação do capital votante da companhia pela União Federal”.

Segundo a petroleira, diante disso, o disposto na Lei das Sociedades por Ações, por se tratar de regra geral, não prevalece diante da especificidade trazida em lei para a Petrobras e, portanto, não há qualquer modificação no direito de voto dos preferencialistas, estando mantidas as mesmas regras de participação usualmente aplicadas nas assembleias gerais ordinárias dos anos anteriores.

No mesmo sentido, a política de distribuição de dividendos da Petrobras também informa que as ações preferenciais da Petrobras serão sempre sem direito de voto, consoante legislação vigente. “Por fim, destacamos que tal informação também é divulgada no Formulário de Referência da Companhia (item 18.1)”, diz o posicionamento da empresa. (Karin Sato – karin.sato@estadao.com)

Este artigo foi publicado em 18 de abril de 2017 (http://www.broadcast.com.br/cadernos/agro/?id=YzZURmRjaUF2SE5jeVRYaXFaU1hxUT09)